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terça-feira, 29 de março de 2011

Quando o Brilho de uma Estrela pode Iluminar o Sol

Era uma vez, uma bela menina chamada Marjorie, com olhos de um brilho único e cabelos longos e negros, ela guardava dentro de si o poder. O poder de ser uma grande vencedora, uma vitoriosa, uma campeã na vida e no trabalho.
A brisa suave lhe tocara o rosto, os olhos fitavam focados a fita amarela a cem metros em sua frente, os ouvidos somente aguardavam o estalo, tornando tudo silencioso a sua volta.

Os pés descalços, era assim que corria Marjorie, talvez pelo sangue guerreiro de índio brasileiro que corria em suas veias.
Ela vivia a dizer: com os pés descalços poder sentir a temperatura do solo, poder ouvir a terra lhe dizer: “te amo”; ver já de antemão o solo sagrado que pisaria ao atravessar a fita amarela. O mundo parecia dizer-lhe: “Vá e conquista o que é teu por direito, por toda dificuldade que passou para chegar onde está. A vitória é sua!”.
TAHHH!

O som único do estampido fez a pequena e bela Marjorie se tornar uma gigante e a cada passo ia conquistando mais uma vitória.

Ao tocar a fita com seu corpo sentiu a suave impressão de uma pétala a lhe tocar. O atravessar a fita lhe fez ver: as pessoas que assistiam caladas, soltarem um grito único de reconhecimento e contemplação extasiada, exatamente como vislumbrara antes da corrida. A satisfação e a sensação de ser única lhe encheram a alma.

Marjorie recebeu o troféu, as honras e a glória e levou este presente para a sua casa. Em casa chegando mostrou o troféu a sua mãe e foi abraçada e beijada, muito festejada, como ela queria.
Então Cathy, sua irmã, paraplégica de nascença, disse:

“Você tem a felicidade de correr como ninguém e, eu não posso dar nenhum passo”.
Enquanto isso, Marjorie extasiada com a reação da irmã, retrucou:

“É isso que eu ganho em trazer esse troféu para você?”

“Troféu é lata, guarde-o para você.” Respondeu a menina, enquanto, colocou as mãos nas rodas da cadeira e saiu agitada.

Marjorie decepcionada, não quis ouvir mais nada, deitou-se no sofá e com os olhos lacrimejantes pegou o controle remoto e ligou a televisão.

A tela se abriu como num piscar de olhos, o som da torcida encheu a sala e um pequeno sentimento de alegria tomou conta de Marjorie ao ver o estádio lotado e a pista de corrida.

Ao focar mais de perto, Marjorie viu que eram adolescentes diferentes, especiais. O locutor anunciou: “Estamos agora na prova dos 100 metros das Olimpíadas Especiais de Portadores de Deficiência”. Marjorie sentiu-se encantada, olhou firmemente na tela, aumentou a nitidez, a luminosidade, as cores e o som.

TAHHH!


O tão conhecido som. Seu coração se encheu de emoção e seus olhos transbordaram de felicidade. De repente, no meio da corrida, um menino de muletas tropeçou e desceu ao chão. Fez-se silêncio em todo o estádio. Então, uma bela menina com olhos diferentes, tinha Síndrome de Down, que estava ganhando, parou. A câmera focalizou seus olhos e naquele momento a partir de sua íris, Marjorie viu como que se abrisse uma cortina em um palco iluminado, ouviu e sentiu todas as imagens, sons e sentimentos de suas vitórias pessoais e nas pistas de corridas. Um banquete lindo de deliciosas emoções e puros sentimentos. De repente voltou a ver a íris da menina enquanto a cortina se fechava.
A menina sábia parou e retornou, chegando até o rapaz, abaixou-se, deu-lhe um beijo no rosto e já cercada pelos outros sete participantes, se abraçaram e juntos foram caminhando. Abraçados, juntos e felizes até a fita amarela. As pessoas de todo o estádio antes caladas, soltaram um grito único de reconhecimento e contemplação e por minutos aplaudiram de pé. Enquanto isso o locutor, perguntou com a voz embargada: “E, você, tem voltado para ajudar os mais limitados a vencer”.
Então Marjorie, embaida de amor, compreensão, carinho e reconhecimento, desligou a televisão e a tela se fechou. Ao fechar os olhos viu, ouviu e sentiu essa passagem se repetir por varias vezes em segundos.

Levantou-se, foi ao quarto de sua irmã e a viu ali de costas para a porta, de frente à janela, naquela cadeira de rodas e então, compreendeu suas limitações. Não mais a de ausência de movimentos das pernas, e sim, a limitação de seu sentimento em compreender o quanto era importante para Marjorie receber sua aprovação e amor. Neste instante, Marjorie sentiu a compreensão tornar maior o seu ser, viu ali na sua frente alguém diferente dela, com outra visão de mundo e ouviu a voz que veio de dentro dela dizendo:

“Como pode você esperar que alguém que ainda não deu um primeiro passo, vibre com seus longos, firmes, fortes e sábios passos rumo à vitória?”

Então Marjorie compreendeu que sua irmã, fez o melhor que pode naquele momento com a intenção positiva de se proteger. Percebeu que havia uma forma, puxou uma cadeira e se sentou ao lado da irmã, de frente para a janela e ali ao seu lado de mãos dadas passou a tarde toda sentada em silêncio. Acompanhou cada respiração, cada músculo, cada som, cada olhar e cada sentimento.

Quando o sol se pôs ela se levantou, sorriu para a irmã, foi a estante e colocou um CD, foi quando a valsa suave tornou doce o ambiente, voltou-se para frente de sua irmã, estendeu-lhe as mãos e com olhar de amor e reconhecimento, disse em tom suave: Vamos dançar?

Sua irmã a olhou com surpresa, mas a confiança soou-lhe mais forte.

Marjorie então, colocou primeiro o pé direito de Cathy sobre o seu, depois o esquerdo. Cathy com os olhos de agradecimento, reconhecimento e amor colocou as mãos no apoio da cadeira e se levantou, enquanto Marjorie lhe abraçava e a segurava firmemente e, então, juntas e felizes, Marjorie iniciou os passos e disse: “São dois pra lá, dois pra cá”.

Anos depois como uma magia, em mais uma corrida vitoriosa, Marjorie ao atravessar a fita amarela, deparou-se com Cathy em seu solo sagrado, onde viu sua amada irmã vagarosamente com confiança e bravura dar seus primeiros passos sozinha em sua direção e abraçar-lhe, como nunca Marjorie pode sonhar que se tornaria realidade.
Somos todos capazes de voltar para ajudar os mais necessitados e limitados a vencer, porém antes temos que compreender.

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